Como nasce uma história? Guiado por esta questão, Hugo Cantegrel apresenta uma narrativa fragmentada, que lembra pedaços de um sonho ao qual tentamos dar sentido. As frases pontuam o espaço. Tiradas de canções, conversas banais ou discursos políticos, essas palavras gravadas à mão não definem nenhuma história. São menos mensagens que produziriam informações, do que pistas que geram especulações. E é como tal que entram em diálogo com as fotografias adjacentes. Uma arma. Um momento de ternura. Um cão pendurado. Uma explosão de violência. As enigmáticas fotografias também derivam de fontes variadas como cartazes de filmes, reportagens e álbuns de família, selecionados ao longo do tempo, intuitivamente. Pode-se ficar tentado a interpretar este processo de seleção como se uma espécie de apropriação se tratasse. Prefiro identifica-lo como uma emancipação. Cortadas, redimensionadas, reimpressas em novos suportes, às obras são dadas uma miríade de vidas alternativas. Os néons crepitam e o conjunto respira. O quadro é pensado como espaço de possibilidades e a exposição como caixa de ressonância. O Hugo Cantegrel compõe um ritmo em superfícies metálicas acolhendo vazios e interlúdios. Uma sinfonia feita de movimentos ingénuos e surrealistas: as figueiras crescem em tripés; As palavras caem no chão; As nuvens iluminam as imagens; E transformam-se em flores.
Assistir a estes arranjos de figuras e sinais transporta-me a um jogo interpretativo. Faz-me refletir e questionar sobre as maneiras como construímos e escrevemos as nossas histórias num mundo onde os fluxos sempre ascendentes e opostos de representações visuais, discursivas e metafóricas nos conectam e nos esmagam ao mesmo tempo.
Sonha os sonhos dos outros? Tem sonhos? Regista-os quando acorda? Conta-os como histórias? Às vezes confunde-os com memórias? Guarda as suas memórias? Imprime fotografias? Compra lembranças? Confunde os conceitos de colecionar e acumular? Sofre de mal de arquivo? A sua cloud está cheia? Que história lhe foi contada? Acredita que a história se repete? Acredita? Reza? Sente-se bem por nada? Publica sobre isso? Usa filtros? O que aparece no seu feed? O que partilha? Que história conta? Costuma ser a personagem principal? O que é a sua paixão? Gostaria de dançar? Qual sua música mais tocada? Conta isso às pessoas? Usa letras como mantras? Lembra-se do seu primeiro beijo? ‘Lembra-se? Torrentes de paixão… E se perder no labirinto de outra história.’
Manon Klein